sábado, 10 de novembro de 2012

Dica de leitura: O Estrangeiro, de Albert Camus

Publicado em 1942, O Estrangeiro, de Albert Camus é considerado pela crítica a grande obra do escritor franco-argelino, o que certamente contribuiu para que ele ganhasse o Prêmio Nobel de Literatura em 1957. Profundamente marcada por um tom existencialista e escrita num contexto do pós-guerra, quando o Existencialismo estava em voga na Europa, sendo pensado sobretudo por filósofos como Heidegger Merleau-Ponty e Sartre, a referida obra foi vista por esse último filósofo como uma emblemática ilustração da existência humana.
Desconcertante e “estranho”, o romance é a trajetória de um homem que viveu a vida de acordo com o seu pensamento e sensibilidade, trazendo à tona o absurdo de existir. É assim que o personagem Meursault narra em primeira pessoa uma história que é dividida em dois momentos: a morte de sua mãe e o seu julgamento enquanto estava na prisão. Aqui, ele é julgado não pelo assassinato de um árabe após uma briga, mas por ter ido contra as regras da sociedade – não chorou pela morte da mãe e ainda se divertiu no dia seguinte. Nota-se, portanto, que em meio a uma atitude niilista e indiferente ao mundo, O Estrangeiro faz uma crítica mordaz à sociedade, à medida que expõe friamente a notícia da morte da mãe: “Hoje minha mãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. [...] Isto não quer dizer nada. [...]” A indiferença do personagem diante do ocorrido ilustra bem o que defendia Sartre, ou seja, a existência está revestida pelo absurdo e nada possui um sentido prévio. Já no dia do julgamento, na segunda parte, Meursault se incomoda tanto com a defesa quanto com a promotoria, que distorce o foco do julgamento e tenta padronizar um sentido para as ações do personagem:

Quanto a mim, sentia-me atordoado pelo calor e pelo espanto. O presidente tossiu um pouco e, em voz não muito alta, perguntou-me se eu queria acrescentar alguma coisa. Levantei-me e, como tinha vontade de falar, disse, aliás um pouco ao acaso, que não tinha tido intenção de matar o Árabe. O presidente respondeu que era uma afirmação, que até aqui não percebia lá muito bem o meu sistema de defesa e que gostaria, antes de ouvir o meu advogado, que eu especificasse os motivos que inspiraram o meu ato. Redargüi rapidamente, misturando um pouco as palavras e consciente do ridículo, que fora por causa do sol. Houve risos na sala. O meu advogado encolheu os ombros e, logo a seguir, deram-Lhe a palavra. Mas ele declarou que era tarde, que precisava de muito tempo e que pedia o adiamento até logo à tarde. [...]

Daí se vê que o personagem não tem nenhuma necessidade de mentir, ele apenas se limita a falar o que pensa, indiferentemente do que lhe possa acontecer. Não nenhuma resistência ou qualquer tentativa de querer se livrar de alguma culpa, como seria de se esperar, pois o mais importante Meursault é indignar-se com a imposição de verdades e de sentidos impostos pelo outro, assumindo, assim, uma atitude cética diante da realidade e de qualquer imposição ideológica.
No mais, fica esta grande sugestão de leitura – uma das obras mais instigantes e perturbadoras, dentre aquelas de teor existencialista...

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